Expansão urbana desordenada ameaça territórios indígenas em Porto Seguro

A cidade de Porto Seguro, um dos destinos turísticos mais cobiçados do Brasil, enfrenta um problema crônico e silencioso: a expansão urbana desordenada sobre territórios indígenas. Seja em áreas homologadas ou ainda em processo de reconhecimento, os territórios Pataxó vêm sendo pressionados por um crescimento urbano caótico, marcado pela especulação imobiliária, ausência de políticas públicas e total omissão do poder público, especialmente da Prefeitura Municipal.

Com imóveis com valores fora da realidade da população local e grande parte da cidade voltada à locação para temporada e construção de condomínios de alto padrão, sobram poucas opções de moradia para as famílias que vivem e trabalham na região. Sem programas de habitação social eficazes e com o aumento da desigualdade urbana, os territórios indígenas acabam absorvendo parte dessa demanda. O resultado tem sido a transformação de áreas como Xandó (em Caraíva), Itaporanga, Ponta Grande e, mais recentemente, Aldeia Velha (em Arraial d’Ajuda) em grandes favelas urbanas, com todos os problemas que esse processo carrega: violência, tráfico, desmatamento, ausência de saneamento e falta total de planejamento urbano.

Em Arraial d’Ajuda, por exemplo, a beira da BA-001, estrada estadual que liga Porto Seguro a Trancoso, vem sendo ocupada por pequenos pontos comerciais erguidos por indígenas e não-indígenas, que buscam uma forma de sustento diante do abandono do Estado. Embora legítima, a busca por renda e autonomia econômica esbarra na completa ausência de regulação, o que tende a criar um corredor de estruturas improvisadas, sem identidade cultural, infraestrutura básica ou integração ao território.

É preciso afirmar com clareza: os povos originários têm pleno direito à autodeterminação, ao desenvolvimento humano e econômico de seus territórios. A construção de moradias, a geração de renda e a ocupação produtiva das terras indígenas não apenas são legítimas como devem ser respeitadas. Mas isso precisa ser feito com planejamento, com escuta, com participação comunitária, e com responsabilidade do poder público.

O principal ausente dessa equação é a Prefeitura de Porto Seguro, que deveria liderar processos de ordenamento territorial e garantir o cumprimento do Estatuto da Cidade, inclusive nos territórios indígenas, respeitando a autonomia dos povos mas oferecendo estrutura, orientação técnica e diálogo institucional. Hoje, porém, o que se vê é a omissão.

Para reverter esse cenário, é urgente:

  • Criar espaços comunitários planejados, que sirvam como feiras de produtos tradicionais indígenas e pontos de comercialização com identidade cultural;
  • Promover audiências públicas com as comunidades Pataxó, ouvindo suas necessidades e cocriando soluções urbanísticas adequadas;
  • Estabelecer planos locais de habitação popular com respeito à cultura e ao modo de vida indígena, evitando favelização e conflitos;
  • Fortalecer a presença do Estado em áreas de ocupação crítica, com ações de saneamento, segurança, saúde e educação;
  • Reconhecer o papel dos territórios indígenas como parte do tecido urbano da cidade, e não como zonas de exclusão.

A falta de moradia é real. A necessidade de geração de renda também. Mas a ausência de planejamento só aprofunda os problemas e precariza os territórios que deveriam ser os mais protegidos. É hora de Porto Seguro enfrentar esse debate com seriedade e devolver aos povos originários o respeito e o cuidado que sempre lhes foram negados, sem abrir mão do direito coletivo à cidade.

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