Featured

VOCÊ JÁ LEU VERISSIMO?

Há perguntas intrigantes. “Você já leu Veríssimo?” é uma delas. Não se pergunta isso esperando um “não” educado ou um “sim” entusiasmado para então seguir adiante. A pergunta é um convite, uma senha, quase uma prova de fogo para identificar uma certa tribo de almas que enxergam o mundo com um sorriso meio cético e um olhar meio terno.

Foi o que aconteceu comigo naquela livraria de shopping. O homem à minha frente segurava um Comédias da Vida Privada debaixo do braço. E imaginei que ele pudesse do nada me perguntar:

“Já leu Veríssimo?”

Não seria uma pergunta sobre literatura ou autores consagrados. Era uma pergunta sobre o cotidiano. Sobre a percepção aguda do ridículo que habita nossos dias comuns.

Responderia que sim, claro, todo mundo deveria ler Veríssimo. Ele certamente iria rir. Pois ler Luis Fernando Veríssimo é como encontrar um amigo muito esperto que te conta, nos ouvidos, a piada secreta que está por trás de tudo.

Seus personagens são Mônicas tentando sobreviver à maternidade e ao casamento, são pais que não entendem os filhos, são burocratas entediados, são pessoas comuns presas na armadilha de suas próprias manhãs de segunda-feira. E é aí que mora o seu gênio. Ele nos mostra que a grande epopeia não está nas guerras ou nas conquistas, mas no cafezinho que entorna na camisa branca minutos antes de uma reunião importante.

“Você já leu Veríssimo?” é uma pergunta que significa: “Você também vê o mundo dessa maneira? Você ri para não chorar? Você percebe que a vida é uma grande comédia de equívocos e que a única saída é rir da piada, mesmo quando – ou especialmente quando – a piada é a nossa?”.

Sai olhando as pessoas passarem. Um garoto com fones de ouvido, uma senhora carregando sacolas, alguém falando ao telefone. E pensei: cada um deles é um personagem em potencial de uma crônica não escrita. Cada um carrega dentro de si uma história trivial, banal, e portanto, profundamente humana, que Veríssimo saberia contar com exatamente a mistura certa de ironia e compaixão.

Então, se um dia alguém lhe fizer essa pergunta – “Você já leu Veríssimo?” – cuidado. Pode não ser apenas um teste sobre um autor. Pode ser sobre como você enxerga o mundo. E se a resposta for “não”, sugiro que reverta isso.
A vida fica mais leve, mais inteligente e muito, muito mais engraçada depois que a gente lê Veríssimo.

(Luis Fernando Verissimo – gênio da crônica, escritor, cartunista e humorista – estava internado em UTI de hospital no RS. Nos deixou neste 30/08/2025, aos 88 anos)

@psrosseto
bpsnoticias.com.br

Você também pode gostar de: